terça-feira, 17 de setembro de 2013

Enquanto a economia global coloca sua bota de motoqueira no pescoço do país, encontrado mais um último poema romântico nos escombros da poesia brasileira


IV


Ela dança em transe
no clube dos corações partidos
gotas douradas estouram no chão
do seu copo de uísque misturado.

No balcão o teórico poeta
olha com desprezo a pista
“não se faz poemas com sentimentos”
mas a explosão mallarmaica não é suficiente  
não resolve todo o problema:
“como encaixar safada no meu verso sáfico?”

Ao longo do corredor
as mulheres vêm e vão cheirando.

Ao fundo sentado nas sombras
o homem separado
corpo vazio, copo cheio
a voz grave da juíza ainda ressoa  
a severa sentença ainda corta sua cabeça.

O jovem dandi se movimenta rápido
estilo Michael Douglas superautoconfiante
puro século XXI
“político, arisco, e meticuloso”.

Trancado no banheiro o velho poeta marginal
sem medida, cem leitores
rabisca na parede o verso final
“tudo vale a pena quando o baseado não é pequeno”
enquanto a vida escorre pelos pulsos abertos
há tempo para uma chave-de-ouro:
“a boa poesia se escreve com sangue”.

Cheirosas
as mulheres vêm e vão disfarçando
e só ela ainda dança
mortíferas gotas de cristais brilham no ar.

Lá fora o segurança negro
analisa o lourinho louco chapado entre os carros
do outro lado da rua

a faca espera.

2 comentários:

  1. Esse é um ótimo poema para uma manhã de segunda.
    adorei !

    ResponderExcluir
  2. Cara, como é que tu consegue esta leveza?
    Tou bem impressionado

    ResponderExcluir