quinta-feira, 28 de março de 2013

A fortuna dos críticos - André Monteiro


A crueldade de Anderson Pires


Bastaria dizer que Anderson Pires é um trovador cruel.

Bastaria dizer que crueldade é cantar palavras sem rodeios.

Bastaria dizer que palavras sem rodeios nos presenteiam com os mais puros e amorosos venenos de suas possíveis e impossíveis amplitudes elétricas.

Bastaria dizer que palavras sem rodeios são justamente aquelas que rodam o sangue e nos fazem saber, sem nunca saber ao certo, onde se perdem e se encontram a miséria de toda moral, a entrega amorosa ao desconhecido, a fugacidade da rua, a (in)segurança de uma biblioteca básica, a paranóia corrosiva dos fascismos cotidianos, a distante e fria ironia, o afeto e o egoísmo, o crime e o castigo, a engenharia de uma vida confusa, a homenagem desconfiada a inimigos entre amigos, e vícios-versos.

Bastaria dizer que Anderson Pires parece saber: a boa reputação de malditos versos livres não se livra facilmente da glória e da herança de sua bendita e má repetição.

Bastaria dizer que Anderson Pires, com toda a legião de seus demônios elétricos, assume a grandeza de se fazer política para além do alcance confortável de um deus e um diabo (política entre, não sobre, parentes e serpentes).

Bastaria dizer que, diante de Trovadores Elétricos, não seria preciso dizer nada e, no entanto, somos tentados a dizer alguma coisa, porque cruéis trovadores elétricos nunca aprendem a arte de nos deixar a língua em paz..


André Monteiro
(Anti)Poeta

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