sexta-feira, 26 de abril de 2013

A fortuna dos críticos - Tiago Rattes de Andrade



Viver, como um verso instantâneo

Ao ler “Trovadores Elétricos”, um instante imediato nos leva a dizer que Anderson Pires dialoga com os beats, com os marginais, com os cânones da poesia brasileira e, sobretudo com um lirismo rock’n roll típico de quem entende a poesia como ritmo.

Poderíamos dizer que ele, portanto, se aproxima de outros poetas “jovens” em voga na atualidade. Daí me sinto instigado a pensar o que difere o poeta em questão – e sua obra -  dos demais, em sua maioria.
O que difere um poeta cheio de “influências” e “referências” de um bom poeta? Talvez seja simples o exercício: retire da sua obra as tais “influências” e “referências” e veja o que sobra. Se nada sobra, não temos um bom poeta. Do contrário, temos assunto.

Anderson, como bom leitor e estudioso, traz consigo uma bagagem de ferramentas poéticas que o permite operar de forma tranqüila e sagaz seus poemas. Daí a relação crítica e sólida com suas referências. A “cor local” da “festa-rock” e do universo acadêmico em sua dualidade “rebeldia-conservação” onde Anderson se forja como poeta (sou um homem inteligente, sem preconceitos, com um copo seco na mão).

A alternância entre o olhar introspectivo (melhor viver fora do alcance de Deus e do Diabo) e a reflexão mais complexa que extrapola a janela do poeta (com poesia/cuspimos fogo sobre São João Del Rei) ganha firmeza na visão crítica e eu diria quase cínica – sem aceitar de forma passiva o elemento pejorativo da palavra (um poema é composto para ser decomposto/é uma fórmula, uma solução, uma política).
“Trovadores” é um livro que mostra a que veio e explica por que era tão esperado. Congrega o tal feeling em seu sentido mais sério e fornece ao leitor uma obra consciente.  Por outro lado a dualidade “poesia-rebelde” x “poesia-projeto” torna-se mais palatável em um primeiro momento para aqueles que já conhecem o autor há mais tempo. Mas isso é um outro papo e pode ser apenas uma nota que dê conta da ambição deste interlocutor sobre a obra de um poeta-amigo.

Usando uma metáfora pobre, mas de qual já fui vítima em outros campos que não a poesia, diria que Anderson em “Trovadores” constitui um canhão poderoso pronto para disparar. O alvo é merecedor de tamanho arsenal. O desafio que se impõe naturalmente é que assim continue e nunca use o canhão para atirar em moscas.

Não há materialidade de linguagem sem ambição e ousadia. Isso está mais do que provado em “Trovadores” (o crítico profissional é uma perpétua conversação entre Pascal e Montaigne). Sendo assim, o livro vitorioso a meu ver, ressuscita a questão de Heloisa Buarque de Holanda há quase 40 anos e que retorna como fantasma:
Entretanto, a aparente facilidade de se fazer poesia  hoje pode levar a sérios equívocos. Parte significativa da chamada produção marginal já mostra aspectos de diluição e de modismo, onde a problematização séria do cotidiano  ou a mescla de estilos perde sua força de elemento transformador e formativo, constituindo-se em mero registro subjetivo sem maior valor simbólico e, portanto, poético.(Apresentação do livro 26 poetas hoje, 1975)

“Trovadores” merece e deve ser lido. Em tempos de “facilidade de se fazer poesia” nos brinda com um horizonte bem interessante. 

Tiago Rattes de Andrade
Poeta. Suburbano. 


a seguir:
Fred Spada

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